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27.12.11

Dia 4 - 15/11/2011

O dia de aniversário começou estremunhado. A falta de posição para dormir no comboio só permitiu 2h de sono. Ainda de madrugada acordamos e esperamos pacientemente pela chegada a Varanasi, com 2h de atraso.
Ao chegar, o riquexó conduz-nos até onde é possivel e a partir daí é de mochila às costas até à Guest House.
Ruas estreitas e labirinticas, pejadas de bicicletas, pessoas e bosta de vaca.
As ruas são tão estreitas que me fazem lembrar aqueles espaços de becos entre os prédios lisboetas.
Chego exausta e ainda tenho 4 andares para subir até ao quarto. Mas este...tem vista sobre o Ganges! Compensa tudo.
Bom...até chegar à casa de banho! É quando me apercebo que os indianos não são propriamente malta com muitas práticas de higiene. Eu acho é que eles nem sabem o que isso é. A nossa casa de banho está imprópria para consumo e pedimos ao empregado que dê um jeito à coisa. Ele olha para nós com aquele ar de "mas que raio querem estas que eu limpe ainda mais??". Enfia-se no wc alguns 10 minutos e só vemos vapor a sair pela porta. O senhor sai e nós entramos. Após fiscalização decidimos limpar nós o WC. O ponto positivo é que consegui tomar o primeiro banho de água quente desde que cheguei à India. Deve ser prenda de anos.
Tomamos um pequeno almoço almoçarado no terraço e seguimos a pé para a zona das piras funerárias.
A visão que tenho é improvável. Não sei se entrámos nalguma brecha de tempo e fomos projectados para a época medieval, se fomos só dar ao set de filmagens de um filme biblico.
As pilhas de madeira, o cenário negro, o fumo, as centenas de homens andrajosos, o fogo, as margens do rio negras. É uma visão dantesca mas ao mesmo tempo viciante.
O Inácio explica-nos o processo funebre.
Varanasi é a cidade de Shiva e tida como a cidade mais antiga do mundo. Mais antiga que o próprio tempo. O Ganges é um rio sagrado pois na suas margens tudo fertiliza e como tal tem o poder de dar vida às coisas.
O maior desejo de um hindu é morrer e ser cremado em Varanasi. Os hindus acreditam na reencarnação e ao serem cremados em Varanasi findam esse processo, atingindo a iluminação.  Se por algum acto altruísta quiserem voltar à vida podem fazê-lo, mas apenas em Varanasi. Nos restantes locais da India, os hindus são cremados mas retomam o processo de reencarnação.
Junto à zona de cremações podemos ver as pilhas de madeira para queimar os corpos. Para cada corpo são utilizados 280kg de madeira e o preço da mesma varia conforme a sua qualidade.
Há desniveis na encosta, que determinam a que casta o morto pertence. Quanto mais alto se encontra, maior a casta.
O corpo chega ao local numa maca em bambu, carregada pelos familiares e vem coberto por tecidos dourados e brilhantes. O morto, que foi previamente untado com óleos, é banhado uma ultima vez na margem do rio para purificação. É então colocado na fogueira e fica coberto apenas por um lençol. O familiar do morto rapa o cabelo, e esse mesmo familiar dá 5 voltas ao corpo em alusão aos 5 elementos num ritual que termina com as cinzas a serem deitadas ao rio.
Aqui apenas é permitida a presença de homens, pois as mulheres sendo mais emocionais estão fora do espirito de alegria e celebração desta cerimónica funebre.
E perante este cenário "levezinho" vamos descomprimir na Blue Lassi. A loja com os melhores lassi do mundo. E é verdade! O de maçã faz-me as delicias!
Daqui vamos a uma casa de venda de sarees e pashemiras. É giro, mas tãooooo demorado que acabo por adormecer enquanto o grupo está mergulhado em sedas coloridas.
A tarde termina com um passeio de barco pelo Ganges ao luar.
E é quando estou completamente embasbacada com Varanasi e suas margens vistas do rio, que o grupo me presenteia com um bolo de aniversário e respectivo cantar de parabens!
Fui tão apanhada de surpresa que nem imagino como raio foi parar um bolo de chocolate e chantily ao meio do Ganges!! Velinhas e tudo! Só faltou a faca para cortar. Mas destemidos como somos...a divisão do bolo fez-se com uma calçadeira que o Carlos, por algum motivo estranho, tinha ali à mão. Nunca usada. Diz ele. E nós acreditamos. Assim como assim, estamos na India e se não for uma calçadeira que nos mata será certamente o chantily hindu.
Tambem nao foi. Lá nos safamos de mais uma.
Saímos do barco perto de uma escadaria onde a população dispersava findas as celebrações religiosas que aconteceram momentos antes. Encontro uma menina, que esforcei-me bastante para reter o nome, sem sucesso. Sei que em português significa "flores". Tem 12 anos e vende carimbos de pós coloridos para pagar a sua escola. Quer ser professora de inglês.  Em toda a India, nos milhares de crianças desgrenhadas que se me atravessaram com os olhares mais infelizes do mundo, foi só esta, de sorriso largo, humor e espontaneidade que me comoveu. A mim e não só.
Voltamos ao hotel e o meu dia de aniversário termina num jantar de grupo de "ilustres convidados" e temos direito a música ao vivo.







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